Amoralidade Brasileira
Reflexões
há 3 anos
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"Às vezes, quando considero as tremendas consequências advindas das pequenas coisas, sou tentado a imaginar que não existem pequenas coisas" Bruce Barton
Hoje, presenciei algo que, ao deitar, veio-me à mente; perdi o sono. Tive que levantar-me para verbalizar os pensamentos que me "queimavam" por dentro.
É madrugada! Mas, que importa?! As pequenas coisas, quando expandidas em círculos concêntricos, como que um espiral, podem demonstrar-nos, a partir do micro, o macrocosmo que vivemos, levando-nos, ainda que num flash, a visão do todo. Talvez, seja esse princípio imanente em mim, que levou-me as reflexões que empreendo neste momento:
Duas crianças, primas, estavam a brincar na casa de sua avó. Em dado momento, uma delas, o menino, por algum motivo que ignoro, agrediu a menina - coisas de criança. A menina começou a chorar, se levantou e foi atrás de sua mãe. A mãe da menina, veio conversar com a avó e disse: "A (nome da menina) disse que a senhora não fez nada". Em resposta, e para minha surpresa, a avó se virou e disse a neta: "Vá a merda (nome da criança)!".
Gostaria de ressaltar alguns pontos que me impressionaram: os adultos envolvidos nesse ocorrido são cristãos; as crianças, filhas de cristãos, de terceira geração; a avó, uma cristã há dezenas de anos.
Aristóteles dizia que o conhecimento começa com o espanto, ou seja, uma vez perdida a capacidade de se espantar às portas ao verdadeiro conhecimento estariam fechadas...
Apesar de serem todos cristãos, ninguém interveio, nem mesmo para dizer "que é isso?!". Todos continuaram tranquilamente, como se nada houvesse acontecido. Como uma cristã, com muitos anos de crença, manda sua neta à merda; uma criança com menos de dez anos de idade?! Pior ainda, ninguém ao menos demonstrou constrangimento pela situação.
Nesse momento tive consciência da profunda amoralidade, qual presenciava, por parte das pessoas que me circundavam.
Aqui se faz necessário diferenciar um estado amoral de um estado imoral. Imoral é quem ou que vai contra a moral. Amoral é que ou quem não tem uma noção moral, ou perdeu-a.
Partindo desse acontecimento, que vos pode parecer insignificante, pude vislumbrar um pouco do que é a sociedade brasileira.
Da mesma maneira que ninguém se impressionou por uma senhora cristã mandar sua neta à merda, percebo contradições gritantes, num povo que urra contra a corrupção política, mas que, em sua conduta pessoal, demonstra, em princípio, a mesma degradação moral que a de seus governantes; sem se espantar com essa acachapante incongruência.
Ambulantes que triplicam o valor de uma mercadoria ao verem um "gringo". Funcionários públicos, gente normal, do "baixo clero", que desviam produtos destinados a uso público, comprados com dinheiro público, para seu uso pessoal: "Levá pra casa, tá 'sobrando'". O motorista que, quando surpreendido em alguma infração de trânsito, procura subornar o policial: "É assim mesmo; polícia é tudo corrupto". O empresário que sonega impostos: "Se não, não dá pra trabalhar!" Advogados e clientes que usam de expedientes inescrupulosos para ganhar ou adiantar seus processos: "que que tem dar um 'agradinho' para o funcionário do Tribunal, para ele dar uma 'ajudinha' no processo". O transeunte que, ao ser abordado na rua por pessoa duvidosa, vendendo produto por um terço do valor de mercado, compra e, quando chega em casa, se gaba pelo negócio feito, mesmo sabendo ou suspeitando ser produto de ilícito. O motorista que estaciona na vaga de idoso ou deficiente: "Tá vazia mesmo, vou voltar logo". O cidadão que nem tem o mínimo de pudor ao jogar lixo em vias públicas, mas que se indigna quando vê na televisão as enchentes que grassam as metrópoles brasileiras: "A culpa é do governo!".
"O jeitinho brasileiro", que demonstra a amoralidade brasileira. Tudo isso, sem que ninguém sinta-se mal, tenha uma dor de consciência, sem que se queira mudar. Somos indiferentes, apáticos a tudo isso, como se fosse a coisa mais normal. Uma profunda indiferença moral.
Enquanto escrevo isso meu peito dói.
Talvez, até certo ponto, seja verdade o dito: "Um povo tem o governo que merece".
Sim! Há exceções! Mas exceções, são exceções; o todo continua intacto.
Eric Voeglin, dizia que um fundamentalista, segundo a perspectiva dele, é uma pessoa que usa, crê, defende e ama palavras vazias de significado em sua experiência real. Ou seja, uma pessoa que tem uma jargão, como que um slogan, desprovido de qualquer impacto em sua conduta pessoal. Esse é o brasileiro. Há muito que palavras como "honra", "moral", "ética", "pátria" deixaram de ter uma significação real na experiência do povo brasileiro. As pessoas simplesmente não se importam com isso, usam essas palavras como mero artifício símio, pura "macaqueação". A mesma pessoa que critica o governo, a corrupção, vai ao seu trabalho, marca o cartão de ponto, e volta para casa descansar; espera o horário de fim de expediente, retorna ao trabalho, marca o cartão de ponto, como se tivesse trabalhado normalmente durante todo o dia, e vai para casa "depois de um longo dia de trabalho", como se tudo estivesse bem. Que é isso, senão um estado amoral?! É de uma insensibilidade moral profunda.
Como um povo pode estar tão inconsciente do papel do individuo enquanto cidadão. Dissociando tão gravemente suas condutas particulares do resultado do todo. O que é a sociedade senão a soma de condutas individuais. Por óbvio, que condutas individuais eivadas de caracteres imorais levarão à uma sociedade amoral, onde levar vantagem "em cima dos outros" é normal e não causa estranheza alguma. Lembremos que muitos desses políticos, um dia, foram pessoas comuns como cada um de nós. Em dado momento chegaram a cargos públicos, de maior ou menor renome, e continuaram a fazer o que se acostumaram enquanto pessoas comuns. Levavam vantagem em sua vida privada e agora levam vantagem em sua vida pública. Tinham um "jeitinho" quando pessoas comuns e, agora, enquanto "homens do poder" arranjam outro "jeitinho". A diferença é quantitativa. Em natureza, em essência, continuam iguais. Antes, o cobrador de ônibus lhes dava o troco errado e eles não devolviam. Agora lhes dão dinheiro público e, eles, esses políticos, enriquecem. A diferença está na cifra. Em natureza é o mesmo.
Os intelectuais brasileiros - com seu impeto destrutivo em propagar teorias nilistas, desconstrucionistas, relativistas, sexistas, visando a derrocada de todo o preceito moral e de todo o paradigma sobre o qual a sociedade se erigiu durante séculos - têm grande culpa nesse estado de coisas.
Dada algumas circunstâncias de minha vida, "volta e meia" tenho contato com pessoas de culturas diferentes. Para mim é um choque. Não que sejam perfeitas, mas percebo como tem um senso moral mais elevado que o nosso. Lembro-me que, tempos atrás, conversei com um sul-coreano que me disse querer ser funcionário público em seu país. Quando perguntei o porquê, respondeu-me: "Quero ajudar meu país a se tornar uma grande nação". Isso me impressionou muito, tendo em vista que, quando faço a mesma pergunta a brasileiros a resposta é: "Quero estabilidade".
E, aqui estamos nós, cristãos, em meio, ou participando de uma sociedade amoral. Talvez, as palavras de Reinhold Niebuhr sirvam para sintetizar a situação: "um homem moral em meio a uma sociedade imoral".
Por óbvio, que a moralidade não é de monopólio cristão, entretanto, devido ao fato que me levou a essas reflexões, além do povo brasileiro genericamente, é aos cristãos, especificamente, a quem me dirijo.
Uma das características da correnteza da presente era maligna (Ef. 2:2) é a capacidade que ela tem de entorpecer o homem. A habilidade estupefaciente, ou seja, de fazer diminuir ou perder a sensibilidade moral. Isso não acontece de uma hora para outra. Não no caso do entorpecimento moral. É um processo gradativo e moroso. Talvez, o exemplo mais claro seja do paciente que toma uma anestesia local, por uma lado não podemos falar que ele está dormindo, e suscetível à cirurgia complexa, contudo, é notório que seu estado de consciência está alterado, tendo em vista que, poderíamos perfurar-lhe determinada parte do corpo sem que ele sequer percebesse. Assim somos nós, roubar a bilhões da Petrobrás nos escandaliza, mas achar dinheiro na rua e não procurar o dono não tem nada de mais.
Repito: e aqui estamos nos cristãos em meio, ou nos imiscuindo, a uma sociedade amoral.
Até onde pude observar, há dois tipos de pessoas que vivem no mais alto padrão de moralidade. As primeiras são aquelas que por receberem princípios e fundamentos morais sólidos, por partes de seus país ou responsáveis, quando de sua infância, cresceram e se tornaram adultos da mais alta probidade. Isso também inclui aqueles que se auto-disciplinaram, auto-educaram, para serem assim, somando-se alguns aspectos culturais propícios. O segundo tipo são os crentes, praticantes de algum tipo de fé.
Vou falar, neste ponto, somente aos segundos, os da fé. Em minha experiência como cristão somente uma coisa pode despertar minha consciência para uma vida no mais alto padrão de moralidade: um contato diário e matinal com meu amado Senhor: Jesus Cristo.
Todas as vezes que me achego a Ele, pelas manhãs, Ele tem a oportunidade de iluminar minha consciência, examiná-la e demonstrar minhas falhas. Então, segundo Seu iluminar e mostrar, posso confessar meus pecados e me arrepender. Quando faço isso, percebo que minha consciência permanece e é aperfeiçoada em um estado de sensibilidade. Isso me leva, em minha vida diária, a procurar fazer as coisas certas e procurar me afastar das erradas. Quando faço isso, percebo que a natureza Dele permeia meu ser, é infundida em mim, e assim algo da pessoa Dele é constituída em meu ser. Puxa vida! É tão bom! Há tanta paz! É uma sensação que não consigo descrever... De consciência tranquila... De dever cumprido... De ter feito o certo...
Quando não agimos assim, nossas faltas não confessadas vão se acumulando, nossa consciência vai ficando, conforme o apóstolo Paulo disse, cauterizada (I Tm. 4.2), opaca, turva, e os estados de insensibilidade moral vão surgindo.
Que Deus nos livre disso. Amém.
26/01/2015
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