quarta-feira, 31 de outubro de 2018

A Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana

A Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana 
– IIRSA como instrumento da política exterior do Brasil para a América do Sul Leandro Freitas Couto – Mestrando em Relações Internacionais na Universidade de Brasília - UnB e Analista de Planejamento e Orçamento. 

Resumo 

O presente artigo analisa a iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana no contexto da atual política exterior brasileira. Faz-se um relato da evolução da iniciativa, destacando suas características e seus principais avanços, assim como ressaltando alguns de seus problemas mais críticos.

 De outra parte, analisa a evolução do posicionamento do governo brasileiro frente à IIRSA, num processo que culmina com a vinculação da iniciativa à sua estratégia de conformação de uma Comunidade SulAmericana de Nações. OIKOS Nº 5 1. Introdução Neste artigo, objetiva-se apresentar a iniciativa IIRSA, posicionando-a como um instrumento da atual política exterior brasileira para a América do Sul. 

Para isso, explorarse-á se OIKOS Nº 5 prazo de 10 anos como horizonte de ação para a implementação do processo de integração das infra-estruturas na região. 2. A Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sulamericana - IIRSA A Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-Americana – IIRSA tem suas origens na primeira reunião de presidentes da América do Sul, realizada em 2000, em Brasília. A IIRSA serviria ao propósito de prover a região de uma infra-estrutura básica, nas áreas de transporte, comunicações e energia, disponibilizando as bases para uma maior integração comercial e social do subcontinente sul-americano. 

O comunicado de Brasília, documento resultante da reunião de cúpula, ratificado por todos os países da América do Sul – exclui-se a Guiana Francesa – contempla um capítulo específico sobre a infra-estrutura de integração. Explicitam-se nele os objetivos orientadores da iniciativa que então se criava: • Identificação de obras de interesse bilateral e sub-regional; • Identificação de fórmulas inovadoras de apoio financeiro para os projetos de infra-estrutura; • Adoção de regimes normativos e administrativos que facilitem a interconexão e a operação dos sistemas de energia, de transportes e de comunicações.4 Com o objetivo de dar prosseguimento aos entendimentos presidenciais, os ministros de Estado de comunicações, transportes e energia da América do Sul reuniram-se em Montevidéu, em dezembro daquele mesmo ano. 

Na ocasião, foi exposto o Plano de Ação para a Integração da Infra-estrutura Regional da América do Sul5 , que estabelecia três linhas gerais norteadoras das ações da iniciativa: coordenação de planos e de investimentos, compatibilização e harmonização dos aspectos regulatórios e institucionais e, por fim, 4 Comunicado de Brasília disponível em http://www.iirsa.org/BancoMedios/Archivos/comunicado_de_brasilia.doc 5 Disponível em http://www.iirsa.org/BancoMedios/Documentos%20PDF/Plan%20de%20Acción%20Montevideo%20final.pd f OIKOS Nº 5 busca de mecanismos inovadores de financiamento público e privado. Ao mesmo tempo, propunha um horizonte de dez anos para os trabalhos da IIRSA.

 Em sua forma inicial, a iniciativa foi planejada para ter suas orientações emanadas de um conselho de ministros de infra-estrutura e de planejamento dos doze países partícipes, denominado Comitê de Direção Executiva – CDE. Ficaria a cargo do CDE guiar os trabalhos técnicos de acordo com as prioridades estabelecidas pelos governos. Para tanto, se reuniria semestralmente para transmitir as orientações dos governos e notificar-se do desenvolvimento dos trabalhos. Logo abaixo, como secretaria executiva, estaria o Comitê de Coordenação Técnica – CCT, responsável pela coordenação dos trabalhos e dos grupos técnicos. 

O CCT seria formado por três entidades multilaterais de fomento, quais sejam, o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID; a Corporação Andina de Fomento – CAF, braço financeiro da Comunidade Andina; e o Fundo para o Desenvolvimento da Bacia do Prata – FONPLATA. Na instância mais operativa, estariam os Grupos Técnicos Executivos – GTE’s, o nível mais técnico da IIRSA, responsável pela execução dos trabalhos de acordo com as orientações do CCT e, em última instância, do CDE. A América do Sul foi dividida em Eixos de Integração e Desenvolvimento, dentro dos quais seriam discutidos e avaliados os projetos de infra-estrutura de integração, e cada um desses eixos seria objeto de um GTE específico.

 Da mesma forma, os temas de financiamento e de harmonização de marcos regulatórios em transportes, energia e telecomunicações formariam, cada um, um GTE. O OIKOS Nº 5 que os investidores estariam submetidos. Desse modo, a IIRSA contribuiria para uma maior aproximação regional, ao discutir aspectos concretos de integração física que serviriam tanto para suportar os aumentos esperados no comércio intra-regional, particularmente com os esforços de aproximação entre Mercosul e Comunidade Andina de Nações, e extra-regional, tendo em vista as potencialidades que se percebia nos promissores mercados asiáticos, particularmente a China, ao possibilitar o escoamento da produção de grãos do centro-oeste brasileiro pelos portos do pacífico. 

3. A seleção de projetos – concepção e críticas À primeira vista, o fato de três instituições regionais de financiamento apoiarem a iniciativa gerou expectativas quanto à possibilidade de implementação de projetos de infraestrutura já constantes do portfólio de cada um dos países da América do Sul. 

Discutia-se a implementação de um selo IIRSA, que garantiria tratamento diferenciado aos projetos identificados pela iniciativa nos organismos de fomento. Do mesmo modo, esperava-se que a avaliação de risco dos projetos constantes da carteira da IIRSA fosse mais vantajosa para os países, dado o grau de convergência política a que estariam submetidos. Assim, num primeiro momento, os países indicaram uma série de projetos de infraestrutura de integração para serem considerados no âmbito da IIRSA. Esse primeiro inventário contava com 335 projetos, no valor de U$ 37,47 bilhões. 

Obviamente, a lista geral apresentava projetos com diferentes graus de maturação, com possibilidades díspares de implementação no curto, médio e longo prazo. Com o objetivo de se realizar uma hierarquização dos projetos, estabeleceu-se uma metodologia de planejamento territorial indicativo, oriunda também da experiência brasileira dos eixos nacionais de integração e desenvolvimento. No âmbito dos GTE’s de cada Eixo de Integração, os técnicos dos governos reuniram os projetos em agrupamentos, identificando, para cada um dos grupos, um projeto âncora. A idéia era explorar a sinergia do conjunto de projetos que se relacionassem, de acordo com a logística de infra-estrutura a ser implementada no território. Com isso, deixava-se de pensar somente a obra, ampliando o escopo de análise para os serviços de logística decorrentes da implantação dos projetos. OIKOS Nº 5 

Em paralelo, o Comitê de Coordenação Técnica da Iniciativa desenvolveu uma visão de negócios para cada eixo, identificando as principais atividades econômicas e os fluxos existentes e potenciais de comércio gerados a partir delas. As informações oriundas desses diagnósticos alimentaram o processo técnico de hierarquização e priorização dos projetos da IIRSA. Aplicou-se, para tanto, uma metodologia de análise multicriterial, pela qual eram analisados os impactos esperados da implementação de cada grupo de projetos no desenvolvimento sustentável da região, nas suas esferas econômicas, sociais e ambientais, e a viabilidade econômica, financeira, ambiental e político-institucional de cada um deles.7

 No campo econômico, eram analisados os impactos dos projetos quanto ao aumento no fluxo de comércio de bens e serviços, quanto à atratividade de investimentos privados em unidades produtivas na área de influência desses projetos e, finalmente, quanto à contribuição para o aumento da competitividade da produção regional. Em termos sociais, eram OIKOS Nº 5 comparada com os 37 bilhões de dólares da carteira completa. Por fim, ressalta-se que todos os países foram contemplados com pelo menos um projeto. Abaixo, vê-se o mapa da América do Sul com os 31 projetos acordados pelos presidentes. 

 Apesar dos GTE’s de Processos Setoriais de Integração que tratavam dos temas regulatórios e de financiamento não terem alcançado a mesma efetividade, a apresentação da AIC representa um marco nos trabalhos da IIRSA. A despeito das análises que se possa fazer acerca dos projetos apresentados, o fato de os doze países terem firmado a lista dos 31 projetos simboliza a coesão da região em torno de prioridades comuns para o seu desenvolvimento.

 Como a IIRSA não apresenta nenhum grau de institucionalidade, chama a atenção a continuidade que se conseguiu imprimir aos trabalhos, a despeito das trocas de governo que OIKOS Nº 5 se processaram em vários países da América do Sul. Isso pode indicar a importância do papel desempenhado pelas agências multilaterais como animadoras do processo. 

Efetivamente, ficava sob responsabilidade do CCT a contratação de estudos e consultorias que orientassem a tomada de decisão dos países sobre os projetos e sobre os avanços do processo setorial de integração. Esperava-se, assim, aproveitar a maior agilidade dos organismos que compunham o comitê técnico, escapando das restrições orçamentárias e legais – particularmente de contratação – dos Estados Nacionais.

 De outro lado, esse modo de operar da iniciativa gera desconfianças quanto ao grau de ingerência dos bancos em seus rumos. Apesar de serem geridas pelos países, essas instituições têm interesses próprios na região, inclusive disputando, mais particularmente BID e CAF, os melhores projetos. A propósito, o Comunicado de Brasília de 2000 afirma que os presidentes decidiram instruir seus governadores no BID e representantes junto aos organismos financeiros internacionais para que, quando oportuno, proponham, naquelas instituições (...) a adoção de todas as medidas necessárias à implementação das propostas contidas no Plano de Ação em anexo, com vistas à realização de estudos, prestação de serviços de consultoria e desembolso de financiamentos para apoiar a implementação de iniciativas visando o desenvolvimento de eixos de integração para o futuro espaço econômico ampliado da América do Sul. Os Presidentes destacaram, neste sentido, a importância singular do trabalho futuro de coordenação com o BID e a CAF, entre outros organismos internacionais e regionais relevantes.8 

A ausência de uma visão estratégica de longo prazo para a América do Sul a orientar a seleção de projetos representa outra falha no processo de seleção de projetos. Proposta para nortear a avaliação dos agrupamentos de projetos, a visão estratégica regional acabou sendo discutida nos países após a apresentação da Agenda de Implementação Consensuada. Em alguns países, como no Brasil, esse processo de discussão ainda está em curso. 

Isso impediu, portanto, que houvesse uma discussão quanto ao modelo de desenvolvimento a ser buscado na região. A partir do momento em que são implementadas nos territórios, as infra-estruturas impulsionam um tipo de desenvolvimento a partir dos fluxos que favorecem. Os países estariam integrando suas infra-estruturas sem ter claro que 8 Comunicado de Brasília. Op. Cit. OIKOS Nº 5 tipo de desenvolvimento querem – se algo que impulsione o desenvolvimento regional ou que alimente ainda mais o modelo agro-exportador típico da maioria dos países da região. 

4. A IIRSA nas primeiras luzes do Governo Lula 

Segundo Paulo Roberto de Almeida, ressalvada a importância que o tema da integração física regional adquiriu na política externa de Cardoso, a prioridade concedida à América do Sul no Governo FHC teria se bastado no plano retórico. O Acordo Mercosul – CAN ficou inconcluso na sua gestão, a iniciativa da ALCSA, lançada por Itamar Franco e Celso Amorim, não foi levada adiante, tendo apenas atuado na mediação do conflito entre Peru e Equador.9 

 Com o advento do governo Lula, a América do Sul é reafirmada como prioridade dentre as linhas de atuação externa do país. O chanceler Celso Amorim, em seu discurso de posse como Ministro das Relações Exteriores, defendeu o aprofundamento da integração entre os países da América do Sul. Segundo Celso Amorim, “a formação de um espaço econômico unificado, com base no livre comércio e em projetos de infra-estrutura, terá repercussões positivas tanto internamente quanto no relacionamento da região com o resto do mundo”.10 

Essa política tornou-se clara nos primeiros meses do Governo Lula. Sua participação na formação do Grupo dos Amigos da Venezuela e a sua viagem à Argentina, primeira como presidente eleito, são bastante representativas. A sua atuação, porém, não se limitou às afirmações de intenções políticas. Os empréstimos do BNDES à Venezuela; o compromisso de construir uma ponte entre os municípios de Assis Brasil, no Acre, e Iñapari, no Peru; a postura ativa no apoio ao então candidato Néstor Kirchner, nas eleições argentinas, emprestam um caráter prático a essa posição do Brasil frente a seus vizinhos. 

A posição política do Governo reflete-se numa mudança na própria estrutura do Itamaraty. A América do Sul, que antes era acompanhada dentro do Departamento das 9 ALMEIDA, Paulo Roberto de. Uma política externa engajada: a diplomacia do governo Lula. Revista Brasileira de Política Internacional, Vol. 47, Nº 1. 2004. 10 Discurso do Embaixador Celso Amorim, por ocasião da transmissão do cargo de Ministro de Estado das Relações Exteriores. Disponível em: SILVA, Luiz Inácio Lula da; AMORIM, Celso; GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. A Política Externa do Brasil, IPRI/FUNAG. Brasília, 2003. OIKOS Nº 5 Américas, ganhou uma Sub-Secretaria específica, vinculada diretamente à Secretaria-Geral, e, assim, ao Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães. 

Quanto à IIRSA, porém, Almeida aponta que essa iniciativa teria sido parcialmente aceita por Lula, que preferiu empregar ações para viabilizar o financiamento bilateral do BNDES as obras de infra-estrutura nos países vizinhos.11 O embaixador Rubens Ricupero, na mesma linha, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, ao percorrer o tema da integração regional sul-americana, ressalta que falta uma dose a mais de espírito de continuidade à diplomacia brasileira12. Nenhum dos dois se detém, no entanto, sobre quais teriam sido as razões para essa aceitação apenas parcial da IIRSA nas primeiras luzes do governo Lula. 

É importante ter em perspectiva, nesse momento, a dança de paradigmas com a qual Amado Cervo caracteriza as relações internacionais da América Latina, na década de 1990. Segundo a construção de Cervo, coexistiram: o paradigma de Estado Desenvolvimentista – autonomista; o Estado Normal – subserviente, destrutivo e regressivo; e o Estado Logístico – única forma que poderia gerar um equilíbrio na inserção das economias dependentes no capitalismo global. Das três formas, o Estado Normal, ressonância da introdução do fundamentalismo neoliberal na América Latina, foi o que mais claramente pôde ser percebido no subcontinente sul-americano na última década do século XX, em diferentes graus de um país para outro.13 

No Brasil, em particular, o paradigma do Estado Desenvolvimentista foi definhando. Apesar de o desenvolvimento continuar no horizonte da política exterior do Brasil, ele deixou de ser o seu elemento de racionalidade. Em seu lugar, tomou parte o Estado Normal, uma invenção argentina de adoção acrítica dos modelos advindos dos centros hegemônicos, e experimentou-se um esboço do Estado Logístico. 

Os reflexos da adoção do Estado Normal se fizeram sentir também no âmbito das relações regionais, onde, a princípio, o Brasil teria mais se distanciado do idealismo que norteava sua atuação multilateral. A formação do Mercosul, que previa integração industrial e desenvolvimento, foi deliberadamente desviada para questões meramente comerciais. E, a integração física sul-americana com Cardoso admitia um papel reduzido 11 ALMEIDA, Paulo Roberto de. 2004, Op. Cit; 12 Entrevista do Embaixador Rubens Ricupero a O Estado de São Paulo, 5 de jun. 2005 13 CERVO, Amado Luiz. 2001. Op. Cit; OIKOS Nº 5 aos Estados, delegando às agências regionais de desenvolvimento e à iniciativa privada o papel de incentivadores e executores do processo. 

De fato, isso gerava, à primeira vista, algumas ambigüidades. A primeira delas diz respeito à delegação da secretaria-executiva às agências multilaterais CAF, BID e FONLPATA. Na mesma linha, chama a atenção a ausência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, segundo maior banco de investimento do mundo e ator-chave para a promoção da indústria nacional, nos trabalhos da iniciativa. Por outro lado, permitiu-se a presença do BID, no qual a influência norte-americana tende a ser muito forte. 

Em agosto de 2003, o BNDES e a CAF promovem o Primeiro Seminário Internacional de Co-financiamento BNDES/CAF: Prospecção de Projetos de Integração Sul-americana. O seminário objetivava identificar projetos de infra-estrutura a serem financiados pelos dois organismos nos doze países da América do Sul, a despeito do processo em curso na IIRSA. 

Esperava-se, com isso, inserir o BNDES no processo de integração física sulamericana. Inclusive, cria-se no Banco um departamento específico para tratar das questões relativas à integração sul-americana. Assim, reforçava-se o papel do Estado brasileiro no incentivo e na orientação do mercado para as áreas consideradas prioritárias, nesse caso a integração regional. 

Atualmente, o BNDES tem em carteira vários empreendimentos nos quais financia as exportações de empresas brasileiras que participam da execução de projetos em países da América do Sul. Na Argentina, dois projetos para a construção de gasodutos levam financiamento de cerca de 240 milhões de dólares referentes à exportação de tubos produzidos no Brasil e de serviços de engenharia prestados por empresas brasileiras. 

No Chile, as operações superam os 150 milhões de dólares com exportações de vagões brasileiros para o metrô de Santiago. Já para o Equador, o BNDES financiou exportação de aviões da Embraer e a construção da Usina Hidrelétrica de San Francisco, no valor total de 304 milhões de dólares. Com o Paraguai, mais 77 milhões de dólares para a exportação de bens e serviços de engenharia referentes à construção da Ruta 10. Por fim, a Venezuela, país mais beneficiado com esse tipo de operação do BNDES, foi contemplada com cerca de 325 milhões de dólares, conforme mostra o quadro abaixo. OIKOS Nº 5 Fonte: Palestra do Sr. Guido Mântega, Presidente do BNDES, na I Rodada de Consultas sobre a Visão Estratégica Sul-americana no Brasil, realizada na sede do BNDES, dia 23/11/2005.14 

Resta observar que os projetos financiados pela modalidade de financiamento à exportação do BNDES não constam da agenda prioritária dos projetos da IIRSA. Tampouco se referem aos projetos apresentados no seminário de co-financiamento CAF/BNDES. 14 

Disponível em http://www.planejamento.gov.br/arquivos_down/spi/iirsa/Guido_Mantega_IIRSA_23nov.PPT. Acessado em 20/02/2006. País/ Projeto Financiamento em US$ ARGENTINA 237.000.000 TGS - Gasoduto San Martín 200.000.000 TGN - Gasoduto Norte 37.000.000 CHILE 153.222.000 Ampliação Metrô de Santiago 153.222.000 EQUADOR 304.565.000 Aviões Embraer para TAME 61.600.000 UHE San Francisco 242.965.000 PARAGUAI 77.000.000 Ruta 10 77.000.000 VENEZUELA 326.400.000 UHE La Vueltosa 121.000.000 Linha 4 Metro Caracas 107.500.000 Linha 3 Metro Caracas 78.000.000 Moderniz. Prod. Maiz y Ganado / Fondafa II 19.900.000 Total Integração América do Sul 1.098.187.000 CARTEIRA AEX/ DECEX5 - OPERAÇÕES CONTRATADAS OIKOS Nº 5 

De fato, a IIRSA tentava conceder um tratamento estritamente técnico ao projeto de integração física. A estrutura montada à época de Cardoso para tratar dos temas da infraestrutura física denota essa idéia, pois tem a coordenação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e não do Ministério das Relações Exteriores que, a princípio, seria o órgão mais afeito ao tema. A Comissão Interministerial para a Integração da Infra-estrutura Regional da América do Sul, criada por decreto presidencial em 17 de setembro de 2001, conta ainda com os ministérios de comunicações, minas e energia e transportes. 

Outro aspecto importante refere-se ao setor de energia. A integração energética ganhou relevância na IIRSA e se constituiu em tema sensível no âmbito da iniciativa. O momento de formação e consolidação da iniciativa coincide com o racionamento de energia pelo qual passava o Brasil, principal pólo industrial, detentor da maior população e, conseqüentemente, maior consumidor de recursos energéticos no continente sul-americano.

 Assim, ao se analisar a carteira mais ampla de projetos da IIRSA, percebe-se que boa parte dos empreendimentos do setor de energia visava atender à demanda do mercado brasileiro.15 Em paralelo, o GTE do Processo Setorial de Integração do setor energético, denominado Marcos Normativos em Mercados Energéticos Regionais, concedia uma lógica “privatista” ao setor, o que gerava desconforto no Brasil, principalmente depois da troca de governo, com a perspectiva de se instaurar um novo modelo regulatório para o setor elétrico e com o excesso de energia que se seguiu ao “apagão”. 

Na VI Reunião do Comitê de Direção Executiva, realizada em 23 e 24 de dezembro de 2004, alguns dias antes da reunião presidencial, esse modelo é alterado. O GTE ganhava nova denominação, Integração Energética. A mudança no nome reflete uma alteração na lógica com a qual o tema seria tratado, não mais pela ótica do Mercado, mas pela ótica do aproveitamento das fontes energéticas dispostas nos países que pudessem favorecer a integração16. 

A despeito de suas ambigüidades, a IIRSA já estava na agenda dos demais países sul-americanos. Durante o primeiro ano de seu governo, Lula recebeu em Brasília todos os Chefes de Estado dos países sul-americanos. Nas declarações resultantes dessas reuniões, sempre era feita uma menção à IIRSA. No comunicado conjunto à imprensa por ocasião da 15 Disponível em http://www.planejamento.gov.br/planejamento_investimento/conteudo/iirsa/index_iirsa.htm 16 Ata da VI Reunião do CDE. 

Disponível em http://www.iirsa.org/BancoMedios/Documentos%20PDF/Acta%20Caracas%20Español.pdf OIKOS Nº 5 visita ao Brasil do chefe de Estado da Bolívia, Sanches de Lozada, ainda em abril de 2003, por exemplo, citou-se que os presidentes de ambos os países constataram o progresso verificado na relação Brasil-Bolívia, que decorre em grande parte do projeto de integração física, o qual constitui exemplo para o seguimento dos objetivos delineados pelos Presidentes da América do Sul na Iniciativa para a Integração da Infra-Estrutura Regional Sul-americana (IIRSA).17 

Outrossim, na Segunda Reunião de Presidentes da América do Sul, realizada em julho de 2002, no Equador – cinco meses antes do Governo Lula tomar posse, portanto – as atenções centrais estavam voltadas para a IIRSA. Segundo comunicado à imprensa feito pelo Itamaraty, o próprio presidente Cardoso teria sublinhado a importância que gostaria que fosse concedida à IIRSA18. 

Em realidade, enfrentando os demais países sul-americanos situações econômicas mais críticas que a brasileira, a IIRSA aparecia como alternativa para a viabilização de uma série de investimentos que, sozinhos, não teriam condições de realizar. Ao desenvolver um processo que pressupunha uma escolha técnica dos projetos prioritários, os países contavam com um maior interesse de organismos internacionais e do setor privado em participar desses investimentos, dado que estaria intrínseco um grau de redução de seu risco. 

Assim, é possível perceber, progressivamente, uma participação mais qualitativa da diplomacia brasileira e do Governo Lula na IIRSA. Na IV reunião do CDE, realizada na Venezuela, no início de julho de 2003, a primeira a realizar-se no período de atuação do novo governo, o Brasil não se fez representar por nenhum Ministro ou Secretário de Estado. O mais alto funcionário do Itamaraty a participar da reunião era um ministro. Ainda, importa ressalvar que o governo brasileiro concedia atenção especial à Venezuela, posição declarada na criação dos Amigos da Venezuela. 

Na V reunião do CDE, realizada no final de 2003, o Ministro de Estado dos Transportes, Anderson Adauto, é o chefe da Delegação Brasileira no Chile. O Secretário de 17 Comunicado Conjunto dos Presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da Bolívia, Gonzalo Sánchez de Lozada (Brasília, 28 de abril de 2003) Disponível em http://www.mre.gov.br/portugues/imprensa/nota_detalhe.asp?ID_RELEASE=159 18 Comunicado Oficial à Imprensa, 

Disponível em http://www.mre.gov.br/portugues/imprensa/nota_detalhe.asp?ID_RELEASE=1352 OIKOS Nº 5 Planejamento e Investimentos Estratégicos do Ministério do Planejamento também estava presente.

 A partir dessa reunião, os encontros do CDE passaram a se realizar no intervalo de um ano. A VI Reunião, contou com a presença, por parte do governo brasileiro, do Secretário Executivo e do Secretário de Política Nacional de Transportes, do Ministério dos Transportes, do Secretário de Planejamento e Investimentos Estratégicos do Ministério do Planejamento, além do embaixador brasileiro no Peru. Mais ainda, esteve presente na reunião o Embaixador Ruy Pereira, Chefe de Gabinete do Secretário Geral do Itamaraty, indicando um envolvimento mais próximo do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães19. 

Com o envolvimento mais ativo da diplomacia brasileira, o Brasil buscava retomar a IIRSA como um instrumento da sua estratégia para a América do Sul. Por ocasião da Terceira Reunião de Presidentes da América do Sul, quando foi criada a Comunidade Sulamericana de Nações, foram assinados dois documentos referentes à integração Sulamericana, a “Declaração de Cuzco sobre a Comunidade Sul-americana de Nações” e a “Declaração de Ayacucho”20, nos quais os presidentes reforçam a importância da integração da infra-estrutura física e reafirmam o respaldo à IIRSA e aos avanços alcançados até então.

 A Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana torna-se, portanto, ao lado da integração econômica e dos valores democráticos, um dos pilares de sustentação da Comunidade Sul-americana de Nações – CASA. Mais importante, com a assinatura da Agenda de Implementação Consensuada, a integração regional passa a ter um plano concreto para evoluir a partir da integração das infra-estruturas na América do Sul. 

 5. Últimos 

Avanços Com a apresentação da Agenda de Implementação Consensuada, a IIRSA encerrou uma fase de planejamento e entrou na fase de execução dos projetos. Nessa linha, a preocupação com o monitoramento estratégico da implementação dos projetos e com os efetivos impactos dos mesmos nos territórios ganhou espaço central nas discussões. Além disso, 19 As listas de presença das reuniões do CDE podem ser acessadas no sítio http://www.iirsa.org/cde.asp?CodIdioma=ESP 20 ambas disponíveis em http://www.mre.gov.br/portugues/imprensa/nota_detalhe.asp?

ID_RELEASE=2721 OIKOS Nº 5 uma  mudança de enfoque para o tratamento dos processos setoriais de integração também consta dos objetivos estratégicos acordados entre os países para o ano de 2006.21 

Obviamente, a partir da apresentação da AIC, os projetos ganharam uma visibilidade diferenciada. Assim, concentrar-se no monitoramento estratégico e na gestão de restrições de cada um dos 31 projetos torna-se fundamental. Destaca-se que, após cerca de um ano da apresentação da agenda, um projeto já foi inaugurado – Ponte sobre o Rio Acre, entre Brasil e Peru, e mais 10 estavam em execução. 

Com a implementação dos projetos, a questão que se torna relevante é quanto ao impacto desses projetos no desenvolvimento regional. Assim, os países acordaram em realizar uma segunda etapa no processo de planejamento, após a conclusão do processo de construção da visão estratégica sul-americana. O objetivo seria melhorar a qualidade do processo de planejamento aplicado na seleção dos 31 projetos, com ações específicas em Avaliação Ambiental Estratégica e análise da integração das cadeias produtivas e da logística.22 

Em realidade, o propósito passa por assegurar que os projetos não se convertam em grandes corredores de exportação, mas que possam gerar desenvolvimento nas suas áreas de influência. Antes mesmo de se concretizar uma ligação interoceânica por meio da integração das infra-estruturas na América do Sul, focaliza-se a importância que esses projetos podem ter no estímulo ao desenvolvimento do interior do continente que, longe da costa, está pouco conectado aos fluxos regionais. 

Os trabalhos referentes à harmonização dos marcos regulatórios não vinham avançando satisfatoriamente. Com isso, os países acordaram em limitar seu escopo. Ao invés de tentar promover a harmonização regulatória entre todos os participantes da iniciativa, assenta-se sobre problemas concretos oriundos do tratamento específicos dos projetos e dos eixos de integração e desenvolvimento.

 Atenção especial deve ser dada à questão do financiamento dos projetos. A viabilização dos investimentos continua sendo o principal gargalo a ser enfrentado pela iniciativa, que busca mecanismos financeiros inovadores, a serem aplicados prioritariamente nos projetos que compõem a carteira consensuada. 

 21 Ata da VII Reunião do Comitê de Direção Executiva – CDE. Disponível em http://www.iirsa.org/BancoMedios/Documentos%20PDF/cde7_acta_%20asuncion_%20esp.pdf 22 Idem OIKOS Nº 5 

Por fim, os países acordaram em promover, a partir de 2006, um processo de ampla divulgação da iniciativa. Em primeiro lugar, isso reflete o interesse dos governos em atrair o setor empresarial para os projetos da IIRSA, sendo assim mais uma forma de tentar viabilizar a implantação de alguns projetos, a partir do interesse da iniciativa privada. De outra parte, ao pretender “gerar mecanismos de participação direta dos setores produtivo, empresarial e social no processo de planejamento e na identificação das cadeias produtivas integradas ou complementares entre os países”23, os países também respondem aos anseios da sociedade civil organizada em ter uma participação mais efetiva na iniciativa. 

Com isso, na medida em que a IIRSA foi se consolidando, fez-se necessária uma avaliação crítica dos caminhos seguidos até então. As propostas para os avanços dos trabalhos apontam para uma revisão de alguns dos seus aspectos mais controversos. Ademais, a vinculação da IIRSA à Comunidade Sul-americana de Nações na estratégia brasileira para a região tende a conferir maior importância à iniciativa, tornando-se ainda mais relevante um monitoramento constante da sua evolução. 

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Disponível em http://www.iirsa.org/BancoMedios/Documentos%20PDF/Acta%20Caracas%20Español.pdf Comunicado Conjunto dos Presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da Bolívia, Gonzalo Sánchez de Lozada (Brasília, 28 de abril de 2003) Disponível em http://www.mre.gov.br/portugues/imprensa/nota_detalhe.asp?ID_RELEASE=159 Comunicado Oficial à Imprensa, Disponível em http://www.mre.gov.br/portugues/imprensa/nota_detalhe.asp?ID_RELEASE=1352 Declaração de Cuzco sobre a Comunidade Sul-americana de Nações. Disponível em http://www.mre.gov.br/portugues/imprensa/nota_detalhe.asp?ID_RELEASE=2721/ Declaração de Ayacucho. Disponível em http://www.mre.gov.br/portugues/imprensa/nota_detalhe.asp?ID_RELEASE=2721/ Entrevista do Embaixador Rubens Ricupero a O Estado de São Paulo, 5 de junho de 2005 Listas de presença das reuniões do CDE. Disponíveis em

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