Nível de atividade física para
prevenção do excesso de
gordura visceral em mulheres pósmenopáusicas: quanto é necessário?
of physical activity in the prevention of excess visceral
fat in postmenopausal women: how much is needed?
Cristiano Penas Seara Pitanga1, Francisco José Gondim Pitanga2,
Carmem Cristina Beck3, Ronaldo Eugénio Calçada Dias Gabriel4,
Maria Helena Rodrigues Moreira5
RESUMO
Objetivo: Analisar a quantidade de atividade física (kcal/semana) necessária à prevenção do
excesso de gordura visceral em mulheres pós-menopáusicas. Sujeitos e métodos: A amostra
incluiu 239 mulheres com uma idade média de 57,2 anos. A área de gordura visceral (AGV) foi
medida por bioimpedância octopolar e a atividade física, com a versão longa do IPAQ. Foram
construídas curvas Receiver Operating Characteristic (ROC) e considerado um intervalo de confiança de 95%. Resultados: As áreas sob a curva ROC para a atividade física moderada e a caminhada revelaram-se significativas. O dispêndio semanal de 1.601 kcal na caminhada ou de 2.283
kcal de atividade física moderada foi identificado como bons valores de corte para prevenir o
excesso de AGV. Conclusão: A prática da atividade física de intensidade leve a moderada, com
um gasto calórico entre 1.601 e 2.283 kcal/semana, previne o excesso de adiposidade central em
mulheres pós-menopáusicas. Arq Bras Endocrinol Metab. 2012;56(6):358-63
Descritores
Atividade física; adiposidade central; gasto energético; pós-menopausa
ABSTRACT
Objective: To analyze the level of physical activity (kcal/week) needed to prevent excess visceral fat in postmenopausal women. Subjects and methods: The sample included 239 women
with a mean age of 57.2 years. Visceral fat area (VFA) was measured by octopolar bioelectrical
impedance, and physical activity, by the long version IPAQ. ROC Curves (Receiver Operating
Characteristic) were drawn, and a 95% confidence interval was used. Results: The areas under
the ROC curve for moderate physical activity and walk proved to be significant. Weekly expenditure of 1,601 kcal in walking, or 2,283 kcal in moderate physical activity were identified as
good cutoff values to prevent excess VFA. Conclusion: Mild to moderate physical activity, with
a caloric expenditure between 1,601 and 2,283 kcal/week, prevents excess central adiposity in
postmenopausal women. Arq Bras Endocrinol Metab. 2012;56(6):358-63
Keywords
Physical activity; central adiposity; energy expenditure; postmenopause
1 Centro Universitário Jorge
Amado (Unijorge), Faculdade
Regional da Bahia (Unirb),
Universidade do Estado da Bahia,
Educação a Distância (Uneb/
EaD), Salvador, BA, Brasil
2 Departamento de Educação
Física, Faculdade de Educação,
Universidade Federal da Bahia
(UFBA), Salvador, BA, Brasil
³ Instituto Federal de Santa Catarina
(IFSC), Campus Palhoça-Bilíngue,
Ponte do Imaruim, SC, Brasil
4 Departamento de Ciências do
Desporto, Exercício e Saúde,
Universidade de Trás-os-Montes
e Alto Douro (UTAD). Centro de
Investigação e Tecnologias AgroAmbientais e Biológicas, Portugal
5 Departamento de Ciências
do Desporto, Exercício e
Saúde, UTAD. Centro de
Investigação em Desporto,
Saúde e Desenvolvimento
Humano (CIDESD), Portugal
Correspondência para:
Cristiano Penas Seara Pitanga
Coordenação de Educação Física,
Campus Paralela, Unijorge
Av. Luis Viana, 6775
41745-130 – Salvador, BA, Brasil
cpspitanga@gmail.com
Recebido em 11/Dez/2011
Aceito em 21/Jul/2012
INTRODUÇÃO
A área de gordura visceral (AGV) é definida como a
quantidade de gordura localizada na região intraabdominal e vem sendo utilizada como um importante
preditor de risco metabólico e cardiovascular (1,2).
Os mecanismos pelos quais a gordura visceral aumentada pode influenciar a elevação do risco meta-
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bólico e cardiovascular podem ser parcialmente explicados pela excessiva produção de ácidos graxos livres
na região abdominal visceral, os quais são distribuídos
por meio da circulação portal expondo o fígado a elevadas concentrações de gordura, reduzindo a remoção
hepática de insulina e resultando em hiperinsulinemia
periférica, com o consequente aumento do risco de desenvolvimento de diabetes mellitus. A hiperinsulinemia
pode também causar distúrbios nas concentrações dos
lipídios plasmáticos, bem como hipertensão arterial (3).
Por sua vez, a atividade física está associada à diminuição dos níveis de gordura visceral (4,5), pressão
arterial (6), glicemia (7) e outros agravos metabólicos e
cardiovasculares (8,9). Estudos têm demonstrado que
o estilo de vida ativo apresenta benefícios para a saúde de indivíduos de ambos os sexos (10,11), porém a
quantidade necessária para que esses resultados sejam
alcançados permanece especulativa.
Além disso, especula-se que a atividade física reduz a
gordura visceral em função do efeito lipolítico causado
pela liberação das catecolaminas secretadas durante o
movimento corporal, proporcionando, assim, altas taxas de lipólise na região abdominal (12). Com a redução da gordura visceral, consequentemente, os níveis de
pressão arterial, glicemia e lipídios plasmáticos também
são diminuídos.
A menopausa representa um marco que determina
mudanças na vida da mulher, inclusive em seu papel
social.
Além disso, propicia sintomas desconfortáveis e
aumento na prevalência de doenças. Entre elas, destaca-se a doença cardiovascular, hipertensão, alterações
lipídicas e diabetes, que, de fato, são mais frequentes
quando comparadas à fase pré-menopausa (13).
Recentes investigações têm demonstrado que a quantidade de 185 a 285 minutos por semana de atividade física moderada provoca benefícios na prevenção de diabetes
em adultos de ambos os sexos. Além disso, esses mesmos
estudos observaram que a caminhada isoladamente parece não trazer benefícios significativos para a prevenção do
diabetes, principalmente em homens (14,15).
Este estudo apresenta relevância porque o conhecimento da quantidade de atividade física mais adequada
para prevenção e tratamento da gordura visceral poderá
ser utilizado em ações de saúde que visem tanto à prevenção quanto ao tratamento de agravos metabólicos e
cardiovasculares em mulheres pós-menopáusicas. Diante
disso, o objetivo deste estudo é investigar a quantidade
de atividade física necessária para a prevenção do excesso
de gordura visceral em mulheres pós-menopáusicas.
SUJEITOS E MÉTODOS
Desenho e local do estudo
Este estudo de corte transversal insere-se no Projeto
Menopausa em Forma, aprovado pela Fundação Portuguesa para a Ciência e Tecnologia e desenhado para
examinar a influência do exercício físico no risco cardiovascular e na aptidão física e funcional de mulheres
pós-menopáusicas (16).
As mulheres que integraram o programa foram selecionadas de um grupo de voluntárias que responderam
a anúncios de jornal, panfletos distribuídos na comunidade, reportagens na televisão e rádio ou que foram encaminhadas por um médico. O recrutamento da amostra foi realizado no conselho de Vila Real (Portugal),
entre os meses de novembro de 2005 e março de 2006
e os critérios de inclusão foram observados por meio da
avaliação da história clínica e reprodutiva, tendo sido
obtido de todas as participantes o consentimento informado assinado.
Todas as avaliações foram conduzidas por dois avaliadores técnica e cientificamente treinados para o efeito
e supervisionados pelos investigadores. O estudo atendeu aos procedimentos da Declaração de Helsinqui
(17) e foi aprovado pelo Conselho de Ética da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro em Portugal
e pela Fundação de Ciência e Tecnologia, também de
Portugal, referência POCI/DES/59049/2004.
Amostra
A amostra foi constituída por 239 mulheres pós-menopáusicas com uma idade média de 57,4 ± 6,6 anos,
respeitando os seguintes critérios de inclusão: (a) ausência de menopausa precoce, (b) inexistência de significativa doença renal, hepática ou hematológica; (c) não
existência de sintomas de angina de peito ou de infarte
do miocárdio nos últimos três meses; (d) não utilização de medicação anti-hipertensora ou antiarrítmica;
(e) ausência de uma hipertensão descontrolada (pressão arterial sistólica ≥ 200 mmHg e/ou pressão arterial
diastólica ≥ 105 mmHg) e; (f) inexistência de condições musculoesqueléticas passíveis de condicionarem a
prática de exercício ou serem exacerbadas por este.
Variáveis de estudo
O estudo incluiu a análise da área de gordura visceral
(AGV) e do nível de atividade física em gasto calórico
(kcal/semana), considerando diferentes intensidades
Atividade física e gordura visceral
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(caminhada, moderada e vigorosa) e o total da atividade física (caminhada + moderada + vigorosa). Para
efeitos de caracterização da amostra, são também apresentados os valores do peso e da altura.
Instrumentação/Procedimentos
A altura foi avaliada com o estadiômetro SECA 220
(Seca Corporation, Hamburg Germany) de acordo
com os procedimentos definidos por Heyward e Wagner (18) e considerando um limite de tolerância de
2 mm (19). O peso e a AGV foram medidos com a
bioimpedância octopolar InBody 720 (20) cumprindo
os procedimentos especificados na literatura. Essa bioimpedância utiliza oito eletrodos, dois em contato com
a palma (E1, E3) e o polegar (E2, E4) de cada mão e
dois em contato com a parte anterior (E5, E7) e posterior (E6, E8) da planta de cada pé. Cinco impedâncias segmentares (braço direito, braço esquerdo, perna
direita, perna esquerda e tronco) são medidas a 1, 5,
50, 250, 500 e 1000 KHz. Os pontos de contato do
corpo com os eletrodos foram previamente limpos com
um tecido eletrolítico recomendado pelo fabricante e
foram observadas as seguintes normas de preparação:
(1) estar em jejum, (2) não consumir álcool 48 antes do
teste, (3) não realizar exercício de intensidade moderada à elevada nas 12 horas antes da avaliação, (4) não
efetuar o exame perante a presença de um estado febril
ou de desidratação, (5) não utilizar bijuterias metálicas
ou implantes dentários com metal (quando passíveis de
serem removidos), (6) não ingerir café, e (7) realizar a
avaliação em fato de banho ou roupa interior.
Vários estudos documentam que o InBody 720 proporciona estimativas precisas da composição corporal total e segmentar (21,22) e da AGV (23). As avaliações foram realizadas em jejum pelo mesmo técnico, e os dados
foram eletronicamente importados para o Excel, usando
o software Lookin’Body 3.0 (Biospace, Seoul, Coreia).
Os erros técnicos do peso, da altura e da AGV foram
obtidos, com base em medições em duplicado em 10
mulheres pós-menopáusicas, por meio da fórmula ET=
(Σd2
/2n)0,5 (d é a diferença entre as duas avaliações e n, o
número de elementos da amostra). Os valores calculados
foram, respectivamente, 0,06 kg, 0,09 m e 0,97 cm2
.
A atividade física foi avaliada por meio da versão
longa do International Physical Activity Questionnaire (IPAQ), reunindo questões relacionadas com a
frequência e duração das atividades físicas realizadas
por mais de dez minutos contínuos durante a última
semana e abrangendo quatro domínios de atividade física (trabalho, meio de transporte, doméstico e lazer).
A validade e a confiabilidade deste questionário estão
documentadas na literatura (24).
Cada um dos domínios de AF foi indicado em minutos/semana por meio da multiplicação da frequência semanal pela duração de cada uma das atividades
realizadas. Para o cálculo do gasto energético, foi multiplicado o valor do dispêndio de energia de acordo
com a atividade realizada, considerando-se sua duração
e frequência semanal (tempo em minutos/semana).
A conversão dos dados obtidos pelo IPAQ em medida de equivalente metabólico (METs) foi realizada de
acordo com a proposta de Heymsfield e cols. (25), sendo considerados os seguintes valores para cada domínio:
trabalho (3,3 METs, caminhada; 4,0 METs, atividade
moderada; 8,0 METs, atividade vigorosa), transporte
(3,3 METs, caminhada; 6,0 METs, deslocação com
bicicleta), atividades domésticas (4,0 METs, atividade
moderada no jardim ou quintal; 3,0 METs, atividade
moderada dentro de casa; 5,5 METs, atividade vigorosa no jardim ou no quintal) e tempo livre (3,3 METs,
caminhada; 4,0 METs, atividade moderada; 8,0 METs,
atividade vigorosa).
O produto do valor de METs da atividade física pela
sua duração e frequência resultou no gasto calórico em
METs – minutos/semana, e sua conversão em kcal/semana foi obtida pela fórmula: METs-minutos/semana
× [Peso (kg) / 60 kg]. O questionário foi aplicado e
analisado pelo mesmo técnico e obedeceu às orientações de processamento e de análise dos dados do IPAQ,
disponíveis no site www.ipaq.ki.se.
Análise estatística
O poder preditivo e os pontos de corte da atividade
física para a prevenção do excesso de gordura visceral
foram identificados por meio das curvas Receiver Operating Characteristic (ROC), frequentemente utilizadas para a determinação de pontos de corte em testes
diagnósticos ou de triagem (26).
Inicialmente foi identificada a área total sob a curva
ROC entre atividade física e a prevenção do excesso
de gordura visceral. Quanto maior a área sob a curva ROC, maior o poder discriminatório. Foi utilizado
intervalo de confiança (IC) a 95%. O cálculo do IC a
95% determina se a capacidade preditiva não é devido
ao acaso, não devendo seu limite ser inferior a 0,50
(27). Na sequência, foram calculadas a sensibilidade e
Atividade física e gordura visceral
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a especificidade, além dos pontos de corte da atividade física para prevenção do excesso de gordura visceral. Valores identificados por intermédio da curva ROC
constituem-se em pontos de corte que deverão promover um mais adequado equilíbrio entre sensibilidade e
especificidade. Os dados foram analisados utilizando-se
o programa estatístico STATA (versão 7.0, Stata Corp.,
College Station, Estados Unidos).
RESULTADOS
A análise descritiva da amostra é ilustrada na tabela 1 e
destaca-se evidenciando seus elementos uma idade média de 57,2 anos (± 6,6) e valores de AGV entre 45,8
e 108,7 cm2
. O gasto energético semanal em atividade
física habitual foi de 5411,5 (± 6937,2) kcal/semana,
sendo obtido, sobretudo, com a prática de atividade de
intensidade moderada (3134,8 kcal/semana).
Atividade física e gordura visceral
Tabela 3. Pontos de corte, sensibilidade e especificidade da quantidade
de AF (kcal/semana) como preditor da ausência de gordura visceral
Atividade física Ponto de corte
(kcal/semana)
Sensibilidade
(%)
Especificidade
(%)
Caminhada 1.601 8,2 68,8
Moderada 2.283 68,2 60,0
Vigorosa NR – –
Total NR – –
NR: indicador não recomendável para a predição da ausência de gordura visceral (pontos de
corte não apresentam boa sensibilidade e especificidade).
Tabela 1. Análise descritiva da amostra (n = 239)
Variáveis Média ± DP Amplitude
Idade (anos) 57,2 ± 6,6 40,6 – 79,6
Peso (kg) 69,1 ± 11,3 45,8 – 108,7
Altura (m) 1,55 ± 5,2 1,42 – 1,70
Área de gordura visceral (cm2
) 134,5 ± 26,9 42,2 – 206,1
Atividade física habitual (kcal/semana)
Caminhada 1724,4 ± 2549,9 0 – 15178,1
Moderada 3134,8 ± 4213,8 0 – 25765,5
Vigorosa 552,2 ± 2467,1 0 – 22304,8
Total 5411,5 ± 6937,2 0 – 45591,1
DP: desvio-padrão.
A tabela 2 apresenta as áreas sob a curva ROC entre
o nível de atividade física (kcal/semana) e a prevenção
do excesso de gordura visceral. As áreas sob a curva
ROC para a atividade física total, moderada e caminhada revelaram significado estatístico (p ≤ 0,05). A AF
vigorosa não foi boa preditora para ausência do excesso
de gordura visceral.
Tabela 2. Áreas sob a curva ROC e IC95% entre a quantidade de atividade
física (kcal/semana) como preditor da ausência de gordura visceral
Atividade física AUC
Caminhada 0,73 (0,63-0,83)*
Moderada 0,63 (0,53-0,73)*
Vigorosa 0,56 (0,47-0,66)
Total 0,70 (0,60-0,80)*
AUC: área sob a curva ROC apresentando poder discriminatório para a ausência de gordura
visceral (Li-IC ≥ 0,50); * p ≤ 0,05.
Na tabela 3, podem ser observados os níveis de
atividade física (kcal/semana) mais adequados para a
prevenção do excesso de gordura visceral nas mulheres
pós-menopáusicas.
Os dados revelam que 1.601 kcal/semana de caminhada e/ou 2.283 kcal/semana de atividade física
moderada constituem os melhores pontos de corte para
predizer a prevenção para ausência do excesso de gordura visceral.
Tabela 3. Pontos de corte, sensibilidade e especificidade da quantidade
de AF (kcal/semana) como preditor da ausência de gordura visceral
Atividade física Ponto de corte
(kcal/semana)
Sensibilidade
(%)
Especificidade
(%)
Caminhada 1.601 8,2 68,8
Moderada 2.283 68,2 60,0
Vigorosa NR – –
Total NR – –
NR: indicador não recomendável para a predição da ausência de gordura visceral (pontos de
corte não apresentam boa sensibilidade e especificidade).
DISCUSSÃO
O estudo demonstra o poder discriminatório do
nível de atividade física (kcal/semana) na prevenção
do excesso de gordura visceral em mulheres pós-menopáusicas, identificando valores de corte do gasto
calórico semanal considerando adequado equilíbrio
entre a sensibilidade e a especificidade. Os resultados
revelam que um dispêndio energético semanal entre
1.601 e 2.283 kcal, articulado à prática de atividade
física de intensidade leve a moderada, previne o excesso
de adiposidade intra-abdominal em mulheres na pós-
-menopausa, não sendo reconhecida uma boa capacidade preditiva da atividade física de intensidade vigorosa.
A relevância desses resultados na promoção da atividade
física e da saúde das mulheres pós-menopáusicas é justificada por vários fatores. Em primeiro lugar, é reconhecido o efeito da depleção estrogênica no aumento da
massa gorda e na aquisição de uma topografia corporal
do tipo androide (28) concorrendo o incremento dos
níveis de adiposidade, particularmente central, para a
ampliação do risco cardiovascular na mulher (29) e para
o comprometimento da sua condição muscular (30) e
óssea (31). O excesso de adiposidade visceral está também associado a um maior risco de câncer da mama
em mulheres nessa fase do climatério (32), sendo documentada, em estudo recente (33), a presença de me-
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362 Arq Bras Endocrinol Metab. 2012;56/6
nores níveis de aptidão aeróbia quando o excesso de
adiposidade central coabita com a sarcopenia, independentemente da idade e do tempo de menopausa.
Revelando uma importante influência genética, o
aumento da adiposidade visceral pode ser atenuado em
mulheres pós-menopáusicas em cerca de 30%, com a
adoção de uma prática regular de atividade física (34).
De acordo com o United States Department of Health
and Human Services, um dispêndio energético entre 13
a 26 kcal.kg.hora, sem restrição calórica, resulta na diminuição da adiposidade intra-abdominal (35).
A presente investigação documenta que a caminhada,
utilizada em contexto de deslocamento, em atividades
ocupacionais e domésticas e/ou no tempo de lazer, gera
uma menor adiposidade visceral quando o gasto energético associado à sua prática ultrapassa 1.601 kcal por semana. Sendo uma atividade física acessível à maior parte das
mulheres pós-menopáusicas, não requerendo equipamento sofisticado ou material técnico específico e constituindo uma das suas atividades físicas de eleição, a caminhada
constitui, assim, uma proposta atraente de promoção de
um estilo de vida mais ativo nessa população.
O estudo revelou também que um dispêndio energético associado à prática de atividade moderada e superior a 2.283 kcal/semana foi um bom preditor no
controle dos níveis de adiposidade visceral na pós-menopausa, o mesmo não acontecendo para a atividade
física vigorosa. Reconhecendo que a mulher nessa fase
do climatério tem preferência pela prática de atividades
físicas moderadas em oposição às vigorosas (36), conferindo-lhes às primeiras maior bem-estar psicológico,
sentimento de energia, autoeficácia e reforço positivo,
particularmente na presença de um excesso de peso e/
ou estilo de vida sedentário (37), o cumprimento desses
níveis de intensidade e de dispêndio energético revela-
-se importante na atenuação nos ganhos de adiposidade
central e da perda das componentes da massa isenta de
gordura, conferindo à mulher bem-estar psicológico e
contribuindo para o aumento da sua adesão ao exercício. Pesquisas relatam (38) e com base nas orientações
de atividade física definidas pelo American College of
Sports Medicine (39), a mulher pós-menopáusica deverá
cumprir pelo menos 150 minutos de atividade moderada por semana, por períodos com pelo menos 10 minutos de duração, período mínimo reconhecido como
suficiente para melhorar a aptidão aeróbia e alguns fatores de risco para doença cardíaca e diabetes melito
do tipo 2. A caminhada e as atividades físicas moderadas poderão ser desenvolvidas em distintos contextos
(recreacional, transporte, ocupacional, doméstico etc.)
e deverão estar orientadas para a melhoria da aptidão
física e para a redução do risco de queda, de depressão,
do declínio cognitivo e da manifestação de condições
clínicas não infecciosas de longa duração. A elevação
dos níveis de atividade moderada para 300 minutos
por semana traz benefícios adicionais para a saúde da
mulher, prevenindo o aumento ponderal e reduzindo o
cancro da mama. O abatimento deste último poderá ser
mais pronunciado se a mulher conjugar a prática de atividade física de intensidade moderada a vigorosa com
outros fatores associados ao seu estilo de vida, como a
restrição de hábitos tabágicos e alcoólicos e a redução
do consumo de gorduras.
O impacto da atividade moderada nos níveis de adiposidade central depende da regularidade da sua prática, sendo aventados por alguns autores períodos de
intervenção de pelo menos um ano, com implicações
favoráveis na qualidade de vida da mulher pós-menopáusica.
As limitações deste estudo incluem o número de
elementos da amostra e as metodologias utilizadas na
apreciação da AGV e dos níveis de atividade física. Apesar de a validade do InBody 720 estar documentada na
literatura, não constitui um método de referência para
a apreciação da adiposidade intra-abdominal. No que
se reporta à quantificação da atividade física habitual, a
medição do gasto energético pelo registro das acelerações ao longo do tempo, recorrendo ao uso de sensores eletrônicos de movimento, proporciona estimativas
mais rigorosas dos níveis de atividade física, comparativamente aos questionários.
Em conclusão, os valores de corte identificados na
presente investigação revelam-se úteis na monitorização e na prescrição da atividade física em mulheres
pós-menopáusicas, objetivando a obtenção de níveis
de adiposidade central mais recomendáveis à saúde na
pós-menopausa. É sugerida a prática de níveis de intensidade leve a moderada, satisfazendo um dispêndio
calórico semanal entre 1.601 e 2.283 kcal.
Declaração: os autores declaram não haver conflitos de interesse
científico neste estudo.
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